Iraque: mudança ou continuidade?

Actual distribuição de lugares no Parlamento do Iraque. Fonte: AFP

Um dos países que mais petróleo exporta, e que recebe por essa via mais de 90% das receitas orçamentais, tem um terço dos seus 40 milhões de habitantes (60% com menos de 25 anos) a viver na pobreza (dados da ONU). A guerra recente contra o Estado Islâmico, a pandemia e a queda do preço do petróleo em 2020, acentuaram o que já era mau.

É com este pano de fundo e com a inevitável revolta que marcou os dois últimos anos, que os iraquianos vão às urnas. Há um novo sistema eleitoral que permite círculos uninominais e candidatos independentes, mas não é certo que algo vá mudar num país em que as tradicionais forças políticas e as milícias pró-iranianas – e o respectivo braço político – têm um peso e uma influência consideráveis. Aliás, todos os campos políticos têm ligações mais ou menos directos a grupos armados e esse é um dos receios após a divulgação dos resultados: saber se aceitam os resultados, sejam eles quais forem.

A questão interna iraquiana está associada à influência regional. Os Estados Unidos anunciaram o fim próximo das missões de combate das tropas que fazem parte da coligação contra o Estado islâmico e podem regressar ao Acordo nuclear com o Irão, do qual Donald Trump decidiu sair. Se a relação com o Irão sofrer alterações nesse sentido, então poderá ser mais fácil resolver as divergências iraquianas no campo xiita, entre aqueles que defendem uma proximidade com Teerão e os que, com uma atitude mais nacionalista, não querem essa relação. E há ainda a questão do Estado Islâmico que, apesar de territorialmente derrotado, mantém células activas e intensificou os ataques.

Foto: egyptindependent.com

Organização

Nas quintas eleições legislativas após a invasão de 2003, mais de 20 milhões de eleitores são chamados às urnas. O voto é electrónico e os iraquianos que vivem no estrangeiro não podem votar. Há 83 círculos eleitorais – cada um elege entre 3 e 5 deputados (são 329) – e mais de oito mil assembleias de voto. Apresentam-se às eleições 167 partidos/coligações e mais de 3.200 candidatos, incluindo quase 800 que dizem ser independentes. Entre os candidatos há 950 mulheres, muito menos do que nas eleições de 2018.

Principais forças políticas.

Campo xiita (188 deputados em 2018)

O partido de Moqtada al Sadr, o Movimento Sadrista, foi o vencedor das legislativas de 2018 (actualmente 54 deputados). É o partido da população xiita mais pobre que tinha o centro do poder na antiga “Saddam city”, bairro pobre da capital iraquiana, rebaptizado “Sadr City”. Tem uma poderosa milícia. É visto como um líder nacionalista, populista, com uma relação turbulenta com o Irão.

A Aliança da Conquista (48), xiita, de milícias pró-Irão.

Houqouq, força próxima de um grupo das milícias pró-Irão.

Aliança do Estado de Direito (25 – o grande derrotado das eleições de 2018) tem o antigo Partido Islâmico Daawa (xiita) como principal pilar e é liderada pelo antigo Primeiro-Ministro Nouri al Maliki. Próximo do Irão.

Aliança das Forças do Estado (42 deputados) que junta o antigo Primeiro-Ministro Haider al Abadi e Ammar al Akim (19), líder do Conselho Islâmico Supremo do Iraque, também eles xiitas.

Campo sunita (56)

Se o campo xiita está dividido, no campo sunita a realidade é semelhante e tem sido essa divisão, a par de uma fraca participação, que tem provocado uma representação parlamentar inferior ao que seria de esperar. O Movimento Taqadom (Progresso) é o que tem maior influência, sendo liderado pelo actual Presidente do Parlamento, Mohammed al Halbousi. Tem concorrência do Movimento Azm (Determinação) liderado por Khamis al Khanjar, um homem com boas relações com o Irão e com outros países vizinhos.

Campo curdo (51)

Apresentam-se os dois partidos históricos, Partido Democrático do Curdistão (25) (do clã Barzani) e a União Patriótica do Curdistão (18) (do clã Talabani). Concorrem também a Jamaa Islamiya, a Nova Geração e o Goran (Mudança).

Liberais (21)

O partido Wataniya tem actualmente 21 deputados.

Campo dos activistas

No campo dos manifestantes que têm contestado o poder no Iraque e que exigiram uma renovação total da classe política, alguns apelam ao boicote das eleições, outros vão concorrer, e outros ainda decidiram integrar partidos e coligações vistos como moderados. O Imtidad é um movimento do campo activista que se organizou para participar nas eleições.

Outras minorias (13 deputados)

Para se perceber/ler um pouco melhor os resultados destas eleições convém reter que os xiitas são cerca de 60% da população e os sunitas 32 a 37%. Os curdos são maioritariamente sunitas. Há também população cristã e outras minorias.

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