Gaza é um terror sem fim

O horror que se vive em Gaza é algo que nenhum ser humano pode suportar/admitir. Mesmo vivido à distância, através do filtro que um qualquer ecrã representa, o bombardeamento de tendas, junto a Rafah, onde estão refugiados palestinianos que já não sabem para onde ir, é extramente doloroso. Em nome do combate ao terrorismo, mata-se a eito. As bombas chovem de todos os lados, a metralha igualmente. Seja contra edifícios de habitação, seja contra campos de tendas onde se abrigam os que ficaram sem nada e os que para aí foram conduzidos com a vã esperança de haver ainda um local seguro.

Palavras ocas

Basta acedermos a um qualquer sítio de notícias e surpreendemo-nos ainda mais: “A Casa Branca apela a Israel a tomar todas as precauções para proteger os civis”. O primeiro-ministro israelita lamentou “um acidente trágico” e disse que está a ser investigado, prometendo conclusões. Sabemos como estas investigações terminam. Quanto ao exército israelita argumenta que atingiu alvos legítimos (dois importantes membros do Hamas) e utilizou munições de precisão. Imaginemos que as munições eram outras que não de precisão. Tanta hipocrisia!

Há quanto tempo ouvimos apelos a Israel para proteger os civis em Gaza? Provavelmente a guerra irá terminar e esses apelos (cínicos) vão fazer-se ouvir até ao fim. Sem ponta de vergonha nem pudor.

E medidas concretas?

À medida que a dimensão do massacre começou a ser conhecida e as imagens mostravam tendas em chamas, surgiram as reacções. Perante 45 mortos, corpos carbonizados e mais de 250 feridos, União Europeia, União Africana, ONU, presidentes e altos responsáveis políticos criticaram o ataque, mostraram indignação e lembraram que a decisão do Tribunal Internacional de Justiça (que ordenou a Israel para parar os ataques a Rafah) está ser completamente desprezada.

O problema é que indignação, não chega. Indignação e preocupação são sentimentos do cidadão comum que pouco pode fazer para alterar o rumo da guerra. Aos líderes de governos e de instituições internacionais pede-se muito mais: pedem-se acções concretas e que, pelo menos, não travem as manifestações por esse mundo fora a exigir um cessar-fogo. Com mais de sete meses de guerra, acções concretas dos líderes de governos ou de outras instituições, nem uma. Nem uma sanção a Israel, nem uma ameaça da União Europeia de suspender o acordo de associação, nem o embargo da venda de armas, nada.

Líderes, mas pouco…

Os líderes políticos que tentam hoje escapar “entre os pingos da chuva” sem mexerem um dedo para obrigar a um cessar-fogo serão julgados pela história. Só nos oferecem discursos cínicos. Vão ter o nome associado à cobardia e à cumplicidade nos crimes que estão a ser cometidos.

António Guterres tem sido uma das excepções. Desde o primeiro momento, o secretário-geral da ONU está do lado certo, enfrentou os poderosos lóbis e disse o que precisava de ser dito, sendo bom recordar que os poderes de secretário-geral não dão para mais. Há momentos que definem a vida e a fibra dos políticos. Basta lembrar os exemplos dados por Mário Soares quando, em 1995, visitou a Faixa de Gaza, tendo sido o primeiro Presidente a dormir no território após o regresso de Yasser Arafat na sequência dos Acordos de Oslo; ou quando algum tempo antes, 1982, visitou o mesmo Arafat, numa Beirute cercada por forças israelitas. São as atitudes certas nos momentos difíceis que dão autoridade aos líderes políticos. Por exemplo, reconhecer o Estado da Palestina, seria uma delas. Afinal, é apenas uma questão de coragem.

Na Faixa de Gaza, desde 7 de Outubro, já morreram mais de 30 000 pessoas, mais de 80 000 ficaram feridas, faltando saber quantas estão debaixo das ruínas de Gaza. Gaza era uma prisão, transformou-se num cemitério e num campo de ruínas. O prolongar do desastre humanitário não é responsabilidade exclusiva do governo siraelita.

O grande objectivo

Benjamin Netanyahu e o governo de extrema-direita querem eliminar qualquer possibilidade de criação um Estado da Palestina. Seja em que circunstância for, o grande objetivo, que se sobrepõe a todos os outros, é obter sempre mais território e, se possível, sem palestinianos. Israel não se desvia um milímetro da estratégia iniciada ainda antes da fundação do Estado, em 1948, e que pode ser ilustrada por uma frase de David Ben Gurion: “Sou a favor da transferência forçada. Não vejo nisso nada de imoral” (actas da reunião do executivo da Agência Judaica, 12 de Junho de 1938, citadas por Ilan Pappé, in “A limpeza étnica da Palestina”).

Os defensores deste grande objetivo, no qual não vislumbram nada de imoral, têm na guerra de Gaza uma grande oportunidade. Estão a aproveitar o melhor que podem. As toneladas de bombas largadas no pequeno território palestiniano, com o apoio principal dos Estados Unidos, não enganam. Não há qualquer sinal de que o massacre possa terminar, não sabemos o que se segue, nem qual poderá ser o balanço final desta tragédia.

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