
O presidente dos Estados Unidos ameaça suspender o envio de (algumas) armas/munições para Israel com o argumento de que algumas delas já terão feito vítimas civis na Faixa de Gaza. Joe Biden também disse, há algum tempo, que discordava de uma ofensiva terrestre em Rafah que não tivesse em conta a protecção dos civis palestinianos. Os Estados Unidos estão preocupados com os civis palestinianos desde 7 de Outubro. Certamente vão continuar a estar preocupados.
Já depois dessa ameaça, um relatório do Departamento de Estado norte-americano diz que “é razoável admitir” que Israel utilizou as armas (norte-americanas) de uma maneira incompatível com o Direito Humanitário Internacional e com a Lei dos Estados Unidos, mas até agora – acrescenta o relatório – os Estados Unidos não chegaram a conclusões definitivas.
Um porta-voz da Casa Branca veio dizer que os Estados Unidos “observam com preocupação” a operação militar israelita em Rafah mas não consideram que ela tenha ultrapassado as linhas vermelhas traçadas por Joe Biden e que a operação não é uma invasão de grande escala ou uma operação terrestre maior.
Estamos num ponto em que os Estados Unidos dizem tudo e o seu contrário, presos na teia que os próprios ajudaram a tecer e continuam a alimentar, fazendo lembrar as promessas dos países ocidentais que forneciam armas à “coligação internacional” que combatia os Houthis no Iémen com a “garantia” de que não seriam utilizadas contra civis.
Mas a questão das armas norte-americanas para Israel, sabemos todos, é muito simples: sem elas, Israel não estaria a fazer o que está a fazer na Faixa de Gaza. As armas norte-americanas (e não só) matam em Gaza, por muito que os malabaristas das palavras tentem dizer o contrário. E, para além disso, sabemos que é tudo uma questão de retórica. Basta atentarmos em três frases do porta-voz das Forças de Defesa de Israel, Daniel Hagari, quando confrontado com a possibilidade de redução de fornecimento de armamento/munições:
- – “O exército israelita tem armas para as missões que está a planear, bem como para as missões em Rafah. Temos o que precisamos”
- – “Até agora, os Estados Unidos forneceram ao Estado de Israel e às Forças de Defesa de Israel assistência de segurança sem precedentes durante a guerra”
- – “Mesmo quando há divergências entre nós, são resolvidas à porta fechada”
Fica claro: o que se diz em público é diferente do que se concretiza em privado. Nada de novo se tivermos em conta que os Estados Unidos sempre têm dito que a aliança com Israel é indestrutível.
Aqui chegados, esta sexta-feira (10) foi esclarecedora quanto a esta ligação dos Estados Unidos a Israel ou, se preferirmos, da forma como a política norte-americana depende (do dinheiro) de alguns israelitas.
Se não há armas, não há dinheiro e não há votos
Haim Saban, um multimilionário israelita-americano, produtor de televisão avisou Joe Biden de que a (eventual) decisão de suspender o envio de armas/munições para Israel é uma “Má, má, má decisão, a todos os níveis”. E acrescentou: “Não esqueçamos que há mais eleitores judeus que se preocupam com Israel do que eleitores muçulmanos que se preocupam com o Hamas”. Está tudo nas entrelinhas se atendermos que este homem é um dos maiores contribuintes para as campanhas eleitorais do Partido Democrata e foi ele que assumiu ter uma fórmula para influenciar a política norte-americana: Fazer donativos a partidos políticos, estabelecer think tanks e controlar meios de comunicação (https://www.newyorker.com/magazine/2010/05/10/the-influencer). Isto é: se não há armas/munições para Israel, não há voto dos eleitores judeus e provavelmente… não há dinheiro para campanhas eleitorais.

Uma última nota desta sexta-feira (10): a Assembleia Geral da ONU votou favoravelmente a proposta de aceitação da Palestina como Estado de pleno direito (143 votos a favor; 9 contra; 25 abstenções). O voto é simbólico, porque no Conselho de Segurança o veto dos Estados Unidos impede que a Palestina assuma esse estatuto de Estado de pleno direito na Assembleia das Nações, mas é revelador para o isolamento internacional de Israel e dos Estados Unidos. E foi durante esta sessão da Assembleia Geral da ONU que o representante de Israel, Gilad Erdan, voltou a mostrar que não tem perfil de diplomata, protagonizando mais uma intervenção hollywoodesca na qual utilizou um triturador de papel para destruir (simbolicamente) a Carta das Nações Unidas, repetindo arrogância e falta de educação ao terminar com um “shame on you” dirigido aos diplomatas dos países que votaram favoravelmente. Imagine caro leitor/a que é este o homem que alguma imprensa em Israel gostaria de ver como sucessor de Benjamin Netanyahu (https://www.jpost.com/opinion/article-800334?utm_source=jpost.app.apple&utm_medium=share)
