O que fica do 13 de Outubro

Cerimónia de assinatura do Acordo de cessar-fogo para a Faixa de Gaza, em Sharm El Sheik, Egipto. Foto: Agência Iraquiana de Notícias

É uma data para ficar na história. Mesmo que tudo falhe depois de libertados os reféns israelitas e os prisioneiros palestinianos, o dia 13 de Outubro foi o dia em que foi celebrada a vida e o regresso à liberdade de cerca de duas mil pessoas.

É cedo para sabermos como vai evoluir a aplicação do Acordo de cessar-fogo assinado no Egipto, mas o que já sabemos é que o dia 13 de Outubro mostrou o isolamento de Benjamin Netanyahu e a quase certeza – tanto quanto seja possível ter certezas no Médio Oriente – de que Netanyahu dificilmente recuperará o espaço e a confiança perdida.

O único amigo que Netanyahu tem, é mesmo Donald Trump e foi precisamente por isso, para não perder essa amizade, que aceitou na Casa Branca o plano que foi agora assinado em Sharm El Sheik. É certo que é um plano feito à medida de Netanyahu, mas é também um plano que obrigou a parar a guerra. Ainda assim, em plena Casa Branca Netanyahu teve de telefonar ao Emir do Qatar e pedir desculpa pelo ataque com que tentou matar, em Doha, os negociadores do Hamas. Trump é amigo, mas não gosta de ver os interesses económicos beliscados.

Os sinais de que o tempo de Netanyahu está a chegar ao fim surgiram logo na noite de dia 12, quando o enviado-especial de Donald Trump, Steve Witkoff, se dirigiu aos israelitas que enchiam a Praça dos Reféns, em Telavive. Witkoff começou o discurso dizendo o nome de Netanyahu e recebeu uma enorme vaia. Insistiu e voltou a receber uma vaia. O cessar-fogo estava a poucas horas de ser assinado, mas muitos israelitas sabem que a guerra já devia ter terminado há muto tempo e se assim tivesse sido, muito provavelmente muitas vidas de reféns teriam sido salvas.

No dia seguinte, no parlamento israelita, Trump e Netanyahu trocaram elogios. Quem mais? Com Trump no púlpito, dois deputados árabes manifestaram-se contra o genocídio e pelo reconhecimento do Estado da Palestina. A segurança retirou-os rapidamente do hemiciclo e Trump registou: “grande eficácia”.

Depois, o presidente norte-americano, para quem Benjaimn Netanayahu pede o Nobel da Paz, sugeriu que Netanyahu fosse poupado aos processos que enfrenta na justiça e nos quais é acusado de fraude, suborno e quebra de confiança. O pedido foi dirigido ao presidente israelita: receber “charutos e champanhe, quem se importa com isso?”. Donald Trump já tinha dito há alguns dias que Netanyahu é um herói nacional em Israel e por isso não merece ser julgado.

Esta relação com a justiça e a forma como Trump e Netanyahu encaram a separação de poderes ficou também expressa na ausência de convite ao presidente do supremo tribunal e ao procurador-geral para que assistissem ao momento histórico no parlamento israelita, assinalado com a presença e o discurso do presidente norte-americano.

O próprio presidente israelita lamentou “profundamente o incidente”: “é um golpe para a política e um acto indigno, especialmente num dia cheio de sentimento, de unidade e de orgulho nacional”. O presidente do parlamento respondeu: “Aqueles que atropelam o Knesset com as suas decisões não podem esperar dele um convite honroso”. Oficialmente, o Knesset disse que não foram convidados porque a sessão no parlamento não foi considerada uma cerimónia de estado oficial.

O presidente do supremo tribunal e o procurador-geral têm estado num braço de ferro com Benjamin Netanyahu porque o governo pretende retirar-lhes poder e transferir esse poder para o parlamento. Foi esse o motivo das enormes manifestações em Israel contra a interferência do poder político no poder judicial, antes de 7 de Outubro de 2023.

Depois de Jerusalém, Trump foi para Sharm el Sheik, onde foi assinado o Acordo de Cessar-fogo. Ainda em Israel, pediu ao presidente egípcio para que convidasse Benjamin Netanyahu e Al Sissi acedeu. Mas Netanyahu não foi. Percebeu que não seria bem acolhido porque havia quem não quisesse ser visto com ele. O convite foi conhecido quando alguns líderes já estavam no local do encontro e a Agência France Press contou que provocou incómodo nos líderes  – alguns não têm relações com Israel – que não queriam ficar na fotografia com um homem que tem um mandado de detenção do Tribunal penal Internacional.

O avião do presidente turco andou às voltas antes de aterrar em Sharm El Sheik. Só aterrou depois de saber que Netanyahu não iria estar presente.

Com um Netanyahu ausente e com um Trump arvorado em grande pacificador do Médio Oriente, houve diplomatas a dizerem que o dia foi… ridículo.

O Acordo assinado é para um cessar-fogo na Faixa de Gaza e apesar de se terem feito representar, não deixa de ser significativo que nem Israel nem o Hamas tenham estado presentes. Para surpresa geral, foi Mahmood Abbas, presidente da Autoridade Palestiniana, quem esteve em Sharm El Sheik.

Pinhal Novo, 15 de Outubro de 2025

01h00

jmr

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