
Ao mesmo tempo que acusa o Hamas de ser o responsável por não haver acordo de cessar-fogo na Faixa de Gaza, o governo de Benjamin Netanyahu não se cansa de “esticar a corda”. O último acto foi o ataque que matou esta quarta-feira, 21 de Agosto, Khalil Hussein Khalil al-Maqdah, acusando-o de, juntamente com o irmão (Mounir al-Maqdah – na foto – líder das Brigadas dos Mártires de Al-Aqsa no Líbano), estarem ambos ao serviço do Irão, de agirem por conta dos Guardas da Revolução iranianos, de traficarem armas para a Cisjordânia e de estarem envolvidos em atentados nesse território palestiniano. O ataque israelita foi no sul do Líbano, junto à cidade de Sídon, perto do campo de refugiados palestinianos de Ain al-Hilweh.
Ou seja, o alvo já não é apenas o Hamas, mas também a Fatah, partido político palestiniano fundado por Yasser Arafat e liderado por Mahmoud Abbas, presidente da Autoridade Palestiniana.
Em resposta a este assassinato, as Brigadas dos Mártires de Al-Aqsa – braço armado da Fatah – denunciaram em comunicado o “assassinato cobarde” de um homem que desempenhou “um papel central” no apoio “ao povo palestiniano e à sua resistência” na guerra contra Israel, assumindo que Khalil al-Maqdah teve um papel maior no “apoio às células da resistência” contra Israel “durante muitos anos na Cisjordânia”.
Em Ramallah, sede da Autoridade Palestiniana, a reacção ao ataque chegou pela voz de Toufiq Tirawy, membro do Comité Central da Fatah e antigo líder dos Serviços de Informação palestinianos: “as forças de ocupação utilizam o sangue palestiniano para deitar gasolina na fogueira da guerra” na Faixa de Gaza.
Para perceber o conflito é essencial perceber isto: para Israel, os combatentes palestinianos (neste caso) da Fatah, são terroristas; para os palestinianos, os combatentes da Fatah são o suporte do povo palestiniano na resistência à ocupação.
Israel “chama” a Fatah ao campo de batalha
Sendo que o argumento de Israel para a guerra na Faixa de Gaza é o Hamas e o ataque de 7 de Outubro de 2023; sendo que a Fatah não estava nem está presente em Gaza; sendo que Fatah e Hamas até são adversários/inimigos políticos, como explicar a acção israelita a não ser como uma forma de pretender envolver a Fatah na guerra que decorre em Gaza e fazer crescer o nível de conflito que já se regista na Cisjordânia? Com as atenções centradas em Gaza passa por vezes despercebido o nível de violência na Cisjordânia, onde os ataques dos colonos israelitas são frequentes e as incursões/ataques do exército israelita são diários, deixando um rasto de destruição (habitações, infraestruturas de água e electricidade, instalações de saúde, escolas…), havendo já mais de 600 mortos desde 7 de Outubro de 2023.
Nada parece fazer parar Benjamin Netanyahu na estratégia de alargar as fronteiras da guerra. Apoiados por dois ministros ultrarradicais (Itamar Ben-Gvir e Bezalel Smotrich) que não se cansam de incentivar à violência e ao ódio contra os palestinianos, os colonos mais radicais atacam aldeias palestinianas na Cisjordânia e já é o próprio Ronen Bar, líder do Shin Bet (Agência de Segurança Interna de Israel) a avisar Netanyahu: o terror judeu na Cisjordânia “coloca o país à beira do desastre” https://www.jpost.com/middle-east/article-714506
As negociações sobre “Filadélfia”
Ainda à espera de uma resposta do Irão devido ao assassinato do líder do Hamas em Teerão – que não se sabe se, como e quando acontecerá – as agências de notícias dão conta de que o primeiro-ministro israelita faz uma exigência à mesa das negociações (com o Hamas, Estados Unidos, Egipto e Qatar) que parece não ter solução: Netanyahu quer ficar a controlar a fronteira (que não lhe pertence) entre o Egipto e a Faixa de Gaza, o chamado “corredor de Filadélfia”. Isso significará uma presença militar israelita no território de Gaza. Os Estados Unidos dizem ser contra uma presença prolongada de forças israelitas em Gaza; o Egipto não quer tropas israelitas na fronteira que tem com o território palestiniano e o Hamas não aceita a exigência de Netanyahu, que aliás foi confirmada pelo gabinete do primeiro-ministro. Israel e o Hamas dizem que aceitam o plano/acordo proposto pelo presidente norte-americano, Joe Biden, em Maio, mas esta questão do “corredor de Filadélfia” e os nomes dos prisioneiros palestinianos a libertar em troca dos reféns israelitas, estão a travar o cessar-fogo.
Reféns e prisioneiros
União Europeia e Estados Unidos repetem a fórmula de ser necessário um cessar-fogo urgente que permita a libertação dos reféns israelitas. Nem União Europeia nem Estados Unidos referem por uma vez a necessidade de libertação dos prisioneiros palestinianos, muitos deles presos sem culpa formada, sem acusação, e sem previsão de eventual julgamento, com sucessivas renovações dos períodos de detenção. Para União Europeia e Estados Unidos, os prisioneiros palestinianos é quase como se não existissem. Quando se esquece isso, significa que não se percebe quase nada do que está a acontecer.

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