Jerusalém não merece

Ben Gvir visita Esplanada das Mesquitas no Dia de Jerusalém. Foto do Jerusalem Post/Yonatan Sindel Flash90

Nota prévia: Segundo a Defesa Civil de Gaza, esta segunda-feira (26 de Maio) a ofensiva militar israelita na Faixa de Gaza, matou, pelo menos, 52 pessoas.

Há muitos anos que o Dia de Jerusalém é utilizado pelos mais extremistas da sociedade israelita para manifestações em que gritam o ódio que sentem pelos vizinhos árabes. Mais uma vez, o bairro muçulmano da Cidade Velha assistiu à “Marcha das Bandeiras”, impotente, perante a passagem de milhares de activisitas nacionalistas da extrema-direita religiosa israelita, que insultam os moradores palestinianos, com a protecção da polícia. As escadarias de acesso à Porta de Damasco transformam-se em palco privilegiado para os cânticos que reclamam toda a Palestina para os judeus. Este é o dia em que os nacionalistas celebram a conquista e a ocupação de Jerusalém Oriental na guerra de 1967.

Este ano não fugiu à regra, mas a guerra na Faixa de Gaza deu ainda mais alento aos que pretendem ver Israel a anexar o que resta dos territórios palestinianos.

Nova Catástrofe

Desde logo o jornal israelita Haaretz registou uma faixa exibida pela organização sionista “Im Tirzu”: “Não há vitória sem uma Nakba” (a Catástrofe, para os palestinianos, aquando da criação do Estado de Israel em 1948), querendo com isto dizer que pretendem voltar a expulsar palestinianos; depois, uma outra faixa: “1967 – Jerusalém nas nossas mãos, 2025 – Gaza nas nossas mãos”.

As faixas da “Im Tirzu”. foto: jornal Haaretz 26 de Maio de 2025

Um dos ministros mais radicais, Ben Gvir, foi à Esplanada das Mesquitas: “Subi ao Monte do Templo no Dia de Jerusalém e rezei pela vitória na guerra (em Gaza), pelo regresso de todos os nossos reféns.” Depois, no Muro das Lamentações, acrescentou: “Devemos lembrar: não podemos dar ajuda humanitária a terroristas. Nem combustível, nem comida, o Hamas precisa de levar um tiro na cabeça”. Para Ben Gvir, o plano é simples: “Jerusalém é nossa, Israel é nosso, Gaza é nossa. E devemos continuar a reivindicar, sem concessões”.

Outro dos ministros mais radicais, Bezalel Smotrich, foi também ao Muro das Lamentações: “Estamos a conquistar a Terra de Israel, a libertar Gaza, a colonizar Gaza e a derrotar o inimigo… com a ajuda de Deus, vamos expandir as fronteiras de Israel, trazer a redenção completa e reconstruir o Templo aqui”.

Parte do relato da Agência Fance Press dá conta do que se passou: “(…) grupos de jovens israelitas foram vistos a atacar comerciantes palestinianos, peões, crianças em idade escolar, bem como activistas de direitos humanos israelitas e polícias. Alguns cuspiram para os peões, gritaram insultos e tentaram invadir casas”.

Esperança

Mas em Israel, embora timidamente e depois de muitos meses de guerra, algumas vozes dissonantes estão a ganhar visibilidade. O líder da plataforma de esquerda “Os Democratas” (junta o Labour, o Meretz e outras organizações), Yair Golan, referiu-se a este Dia de Jerusalém e à chamada “Marcha das Bandeiras” como “imagens chocantes”: “Isto não é amor por Jerusalém, é ódio, racismo e delinquência”. Também o líder da oposição no Knesset, Yair Lapid, classificou a manifestação como “um festival de ódio e racismo”, considerando-a “uma vergonha” e “um insulto a Jerusalém”.

Também em contraponto com as provocações e os cânticos racistas dos extremistas, numa outra porta (Jaffa) da Cidade Velha, uma “Marcha das Flores” organizada por jovens para falar de paz: “Damos flores de paz aos moradores de Jerusalém, em particular aos muçulmanos, aos cristãos”. Uma das organizações desta marcha é a Tag Meir que junta ONG’s que lutam contra o racismo e os crimes de ódio.

A deriva alemã

A tragédia da Faixa de Gaza é um verdadeiro naufrágio para os Direitos Humanos. Um crime que tem autores e tem cúmplices. Entre os cúmplices está a União Europeia, enquanto instituição, e também individualmente, embora alguns países já se tenham demarcado. E depois há ainda os que são a desgraça dentro da desgraça, como é o caso da Alemanha.

Ministro dos Negócios Estrangeiros da Alemanha, Johann Wadephul e o PM de Israel, Benjamin Netanayahu, em Jerusalém, 11 de Maio de 2025. Foto Roi Avraham (GPO)

Por um lado, o Chanceler Friedrich Merz, ameaçou retirar o apoio ao governo de Netanyahu: “Francamente, não compreendo o que o exército israelita está a fazer na Faixa de Gaza e não vejo qual é o seu objetivo em afectar a população civil desta forma, como tem acontecido cada vez mais nos últimos dias” (…) “Isto já não pode ser justificado por uma luta contra o terrorismo do Hamas”; por outro lado, o Ministro dos Negócios Estrangeiros, Johann Wadephul, optou por outra linha de raciocínio: “Como país que considera a segurança e a existência de Israel um princípio fundamental, a Alemanha tem sempre a obrigação de ajudar Israel a garantir a sua segurança”, o que “inclui naturalmente a disponibilidade para fornecer armas no futuro”. Por causa do passado – cerca de seis milhões de judeus morreram devido à política de extermínio nazi – a Alemanha considera a segurança e a existência de Israel uma razão de Estado.

Pinhal Novo, 27 de Maio de 2025

00h15

jmr

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